línguas selvagens
2016
"Na boca um segredo escondido em cada papila. Suores pelo peito, virilha e sovaco. Arrepios, rápidos espasmos. Movimentos involuntários do corpo que deseja corte. Um corte para acabar com a corte... Não só a língua, mas o corpo
inteiro parece cindir dividindo os meridianos. Inspirar respirar e transpirar. Cirurgia não autorizada. Na intenção da criação de um sotaque outro, sintaxes para gramáticas não nascidas. O segredo está guardado com [...]. Línguas que desfalam descolonizam a fala... serpentina serpente voa rasteja lambe e dá dentadas... para descolonizar uma língua adestrada: água saliva sangue litros de suor fino atravessando a cidade É PELA BOCA QUE GOZO
Arde como se queimasse. Ponto por ponto. Incha. Papilas regenerando tecidos rigidezes massas moles. Quinto dia: aberta a correnteza rubra da linguagem dos feitiços. É pela língua mutilada de multi-lados que aprende-se uma língua morta nonata: uma língua arrastada pelas caravelas. É na corredeira deste tecer à margem que corro. Atrás e adiante, na fuga e na caça. Quando a boca enche de sangue vem um gosto de ferro doce e morno primeiro líquido depois virando gelatina... Língua ao molho pardo.
Abrir uma terceira margem para ampliar o paladar e falar noutras línguas. Para falar na língua das serpentes. “Me ensinaram a morder chupar roer lamber e dar
dentadas” (PATROCÍNIO, p.125, 2009)1 Khechari Mudrã para controlar a fome e a sede, afastar a morte e a doença. Bifurcar a língua e cortar o freio: dobrar a língua e perder o freio. Língua: conexão com o réptil reptílico complexo límbico. De lá que lambe. A língua é obcena. Dividir a língua para dobra-la sobre si mesma e radicalizar a linguagem. Bato palmas com as línguas que tenho. Esses idiomas são selvagens. Menos humana, muito menos humana. Monstra, bicha, bicho. Afasto-me gradativamente da humanidade, afastar todo traço de humanidade restante em mim. MATE O HOMEM BRANCO DENTRO DE VOCÊ MATE O HUMANO QUE HABITA EM VOCÊ." (Texto extraído da tese de doutorado “Perenidades, porosidades e penetrações: [trans]versalidades pela carne / Pedregulhos pornográficos e ajuntamentos gózmicos para pesar: Eu não sabia que sangrava até o dia em que jorrei” (Elton Panamby, 2017)
Aparição, paisagem sonora e edição: Elton Panamby
Modificador corporal: Ângelo Martinez
Câmera: Matheus Santos